Moradores de Ermelino Matarazzo podem perder local de cultura

Texto por Thalita Archangelo

Fotos por Débora Bandeira e Thalita Archangelo

Podcast por Beatriz Gimenez e Rachel Castilho

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O movimento cultural da zona leste enfrenta mais um obstáculo – dessa vez diretamente ligado ao seu funcionamento. No dia 30 de outubro, funcionários da Prefeitura Regional de Ermelino Matarazzo foram até o local entregar um ofício de interdição imediata alegando problemas estruturais do prédio.

A Ocupação Cultural de Ermelino Matarazzo, nomeada de Mateus Santos, possui um laudo emitido em setembro, onde são atestadas as boas condições do prédio. William da Silva Santos*, membro do Movimento Cultural de Ermelino Matarazzo desde sua inauguração, afirma haver perseguição política por parte da prefeitura. Ele lembra do episódio, ocorrido em maio, onde o Secretário Municipal de Cultura André Sturm ameaçou “quebrar a cara” de um dos membros do Movimento durante uma reunião sobre renovação de parceria para administração do local. “Depois do episódio, o secretário ficou chateado com a gente”, afirmou Santos.

Literatura Periférica no Movimento Cultural Ermelino Matarazzo.

Ainda sobre o ofício de interdição, o integrante do Movimento afirma que “não há indícios de rachaduras, de trincas, de descolamentos de placas (..)Tem um laudo da Prefeitura e um laudo nosso, independente. Eles se conflitam. Ambos indicam que há necessidade de reformas no prédio, mas as coisas deveriam ser feitas em parceria”.

O próximo passo para barrar a ordem da prefeitura para o fechamento do local já está sendo tomado. As pessoas podem de forma voluntária colocar e compartilhar vídeos dizendo ‘não’ à interdição através da hashtag #OcupaErmelinoResiste. “Não é um grupo de cinco ou seis pessoas como se imagina. São vários coletivos, com várias pessoas, com apoiadores do bairro. (…) A gente tem a população do nosso lado”. Depois de diversas tentativas, a reportagem não conseguiu contato com a Prefeitura Regional do bairro para comentar sobre o impasse.

Campanha feita pelo Movimento.

Não é de agora que a Ocupação Mateus Santos passa por uma série de burocracias com a Prefeitura Municipal e Regional. Depois de fazer parte da Rede Cultura ZL, os membros da Ocupação Cultural notaram que a luta deveria ser mais regional e rebatizaram de Movimento Cultural de Ermelino Matarazzo.

Através do grupo Balaio foram convidados a ocupar a praça central do bairro, entre 2014 e 2015 a fim de pressionar a Prefeitura Regional para que um espaço no fosse direcionado à cultura. A ocupação do prédio público fechado há 20 anos onde hoje funciona o Centro Cultural foi autorizada pelo antigo prefeito regional Alberto Santos. O local foi sede da Subprefeitura de Ermelino Matarazzo e está ocupado a pouco mais de um ano.

Santos lembra que durante a gestão do antigo prefeito, Fernando Haddad (PT), foi iniciado um projeto piloto de co-patrocínio. Nele, foram repassados para o Movimento cerca de 110 mil reais que serviram para a manutenção do espaço físico e dos projetos durante um período de seis meses. “A ideia da Prefeitura da gestão Haddad era através de um baixo custo gerar um espaço em parceria com os coletivos, o que é muito mais econômico”, declara Santos.

Arte realizada pelos integrantes.

Já na gestão de João Doria (PSDB), Santos afirma que o secretário municipal de cultura, André Sturm começou com um diálogo muito bom, mas “infelizmente ele [o secretário] deu a entender que não tem um tato para lidar com o ‘não’. A gente fez uma negativa e ao invés de tentar gerar um comum acordo, ele se exaltou e gerou o que gerou”. O membro do movimento lembra ainda do congelamento feito pela Prefeitura de 43,5% da verba destinada à pasta. “A gente sabe que essa verba não vai deixar de ser investida em espaços grandes, mas sim em espaços pequenos. Parece que há uma tentativa de enxugar o que já vinha de uma necessidade de ampliação”.

Apesar das diversas dificuldades que enfrentam com o poder público, Santos ressalta que existem políticos sensíveis à causa do Movimento Cultural. “Tem alguns políticos que entendem que a causa é justa, mas vou preservar os nomes para não dar a entender que somos ligados a eles. ” Ele declarou ainda que em nenhum momento houve pedido de apoio. “O político veio aqui e ofereceu: ‘sou sensível a sua causa’ (…) a gente foi muito claro: não vamos levantar bandeira para nenhum partido e nenhum político (…) a gente conversou que isso deveria ser preservado para não dar a entender que há uma parceria política e a gente ser rotulado como alguma coisa”.

De acordo com Santos, hoje o Centro Cultural conta com o trabalho de voluntários, a venda de camisetas e de artigos das exposições que abrigam e arrecadações em eventos fora do Centro Cultural. Além disso, eles aguardam a liberação da terceira parcela referente a um edital no qual foram contemplados.

Interior da ocupação.

Em outubro, André Sturm afirmou ao jornal Folha de S. Paulo que “aquele rapaz muito gentil de Ermelino Matarazzo [se referindo ao desentendimento que teve com um dos membros do grupo] recebeu da secretaria R$ 400 mil em 12 meses. Foram R$ 400 mil numa casa de cultura com quatro pessoas”. Quanto a essa declaração, Santos desmente o secretário afirmando que “nós não recebemos R$ 400 mil. É colocado como se esse dinheiro fosse para aquelas pessoas [citadas na matéria do jornal]. Todo o dinheiro foi feito prestação de conta. Todo recurso que foi aplicado aqui foi prestado conta”.

No local são realizadas oficinas de fotografia, grafite, exposições, cine debate, sarau, além da biblioteca que fica disponível para qualquer pessoa que queira pegar um livro – basta deixar seu nome e um telefone para contato. De acordo com o membro do movimento, o fluxo de pessoas que passa pelo Centro Cultural é muito grande. Pensando nas mais diversas atividades e no trânsito de membros de outros projetos e coletivos, Santos estima que o número de pessoas circulando por mês na Ocupação chegue a mil.

A importância de um espaço cultural como esse na região se dá, para Santos, porque “Ermelino tem um potencial enorme cultural. São dezenas de grupos que estão procurando um lugar”. Ele também aponta para a troca de experiências e a interação como ponto importante a ser lembrado “Não só agir em rede como ter um espaço que seja compartilhado pela rede e aberto a todos tem uma importância incalculável”.

Gisele Miranda de Oliveira, estudante de letras, é frequentadora do Centro Cultural há quatro meses e ajuda com as fotografias dos eventos. Oliveira ressalta que “além de trazer a oportunidade a poetas e artistas da periferia, ter um espaço para divulgar o seu trabalho também enriquece no conhecimento e cultura do bairro”.

Gisele Miranda de Oliveira e William da Silva Santos no Movimento Cultural Ermelino Matarazzo.

 

Ermelino Matarazzo

Distrito situado na zona leste da capital paulista, Ermelino Matarazzo tem 8,70 Km² de área e 113.615 moradores (2010), de acordo com a Prefeitura Regional do bairro. Abriga desde 2005 o campus EACH-USP (Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo) e é cortado pela linha 12-Safira da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos).

Embora seu IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) seja de 0.801, considerado elevado, a principal carência da região é a de empregos. 97% da população (censo 2010) não trabalha no distrito, o que faz com que haja grande necessidade de locomoção por parte desses trabalhadores.

A produção cultural e artística no bairro é muito intensa. Grupos como Periferia Invisível, Cultura ZL e a própria Ocupação Mateus Santos atuam promovendo a articulação cultural na região há anos. Ermelino Matarazzo é hoje um centro de cultura com cada vez mais potencial de crescimento.

Ocupação Movimento Cultural Ermelino Matarazzo.

*A pedido do entrevistado, fica registrado que todas as declarações são opiniões de William da Silva Santos e não representam todo o grupo.

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Exposição: Migrações à Mesa

Por: Adriana Vieira, Barbara Bastos, Ingrid Duarte, Giovana Costa e Maria Victória Gonçalves

O Museu da Imigração do Estado de São Paulo é uma instituição pública que é vinculada à Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo. Localizado na Mooca, ele conta com diversas exposições. O edifício é um patrimônio histórico tombado e a princípio, era abrigo para os imigrantes que chegavam no Brasil, em condições precárias de vida e moradia. Hoje em dia, o local oferece a oportunidade de refletir e compreender o processo migratório de milhares de pessoas, seja através de exposições ou do próprio ambiente de nostalgia criado.

Os primeiros imigrantes italianos começaram a chegar ao Brasil em maior fluxo entre as décadas de 1880 e 1910, principalmente, para as regiões sul e sudeste do país. Grandes partes de italianos que migrou para o Brasil eram de origem humilde, principalmente de regiões rurais da Itália. O Brasil era visto como uma terra nova, repleta de oportunidades e precisava de mão de obra. O Estado de São Paulo recebeu 70% de todos os imigrantes italianos.  Hoje possui cerca de 12 milhões de italianos e descendentes, representando 30% da população. A cidade de São Paulo possui cerca de 11 milhões de habitantes, sendo que seis milhões são italianos ou descendentes, aproximadamente 55% da população da cidade são de origem italiana, de acordo com o site Debates Culturais.

Contemplando a trajetória dos migrantes, a exposição “Migrações à mesa”, iniciada em 2016, aborda a relação entre os costumes e a história das pessoas que chegaram no Brasil em busca de condições melhores de vida. Além da culinária, cadernos de receitas típicas e registros históricos de cada família, a é possível ver fotos, vídeos e informações aprofundadas sobre as condições de vida dos migrantes. O Museu também conta com uma grande quantidade de conteúdo sobre as terras de origem e as peculiaridades daquele povo. É notável como os tesouros afetivos que as receitas e registros guardam não se limitam aos dados e cadernos, ocupam também importantes espaços na memória de quem visita o local.

Em entrevista com o engenheiro Luiz Claudio Gonzalez, de descendência espanhola e italiana, ele conta um pouco sobre a vinda de sua família ao Brasil e também, sobre os principais registros encontrados no Museu da Imigração, bem como a importância desses documentos.

Confira o podcast na íntegra:

Crônica: Os dois lados do guichê

Texto por Daniel Yazbek, Giovanna Cicerelli e Júlia Mesquita

Fotos por Júlia Mesquita

Na antiga gestão de Fernando Haddad, o programa “De Braços Abertos” previu a reinserção social dos usuários de crack e dependentes químicos, dando a eles emprego na área de zeladoria da cidade como garis e outros cargos. Da prefeitura, recebiam um salário mínimo e, além disso, não precisavam dormir nas ruas,  pois o programa também incluía pagamento de estadias nos hotéis da região para que os mesmos tivessem mais dignidade e a oportunidade de dormir em um lugar menos vulnerável que a calçada,  tomar banho e, também, quem optasse poderia procurar as clínicas de reabilitação, nada era forçado e havia diálogo entre os agentes sociais e os moradores em situação de rua.

O projeto desenhado no papel realmente parecia ser um sonho em relação à redução de danos, mas na prática o programa desandou: os traficantes de droga sabiam que aqueles dependentes químicos inscritos no programa receberiam aquele dinheiro todo mês e passaram a vender a droga antecipadamente, o que era muito ruim para os dependentes químicos, pois ficavam sempre em dívida com as quadrilhas.

Foto: Júlia Mesquita / Moradores em situação de rua dormem na calçada do centro de São Paulo.

Ouve-se muito o discurso entre os utilizadores: “a droga é ingrata, ela consome o ser humano de um jeito que a pessoa não consegue ficar sem” e esses encontravam-se sempre nessa situação: vítimas do vício e na mão desses traficantes. Nos hotéis parceiros do programa da Prefeitura, os usuários também enfrentaram problemas de diálogo com os donos e funcionários dos locais. “mas a culpa não é deles” – diz um ex-usuário de drogas e ex-morador em situação de rua, em palestra no Pessoal do Faroeste, centro cultural situado no Parque da Luz – “o problema está em não colocar pessoas preparadas para lidar com moradores de rua e dependentes químicos”.

Os hotéis ficaram sem saber o que fazer com o aumento no número de estupros, prostituição e cenas repentinas de agressividade que aconteciam e enfrentavam dentro de suas paredes, até porque não possuíam estrutura psicológica nem instrução suficiente para lidar com o problema social agora instaurado em seus espaços. Por conta desses e de outros problemas – como a forma que o “De Braços Abertos” era visto pela maioria da população paulistana – o programa recebeu muitas críticas. Inúmeros políticos, principalmente de oposição ao prefeito, apontavam essas falhas, assim, de modo a desmerecer todo projeto cuja ideia era relativamente boa, só precisava de reparos.

Com a nova gestão de João Dória, o projeto de De braços Abertos foi desfeito e colocado outro no lugar, o “Redenção“, resultando em ações truculentas da Guarda Civil Metropolitana (GCM) e da Polícia Militar (PM) com sua Rota (Rondas Ostensivas Tobias Aguiar). Mas  o que viu-se não foi a tentativa de diálogo, foram viaturas, tratores e policiais armados que pegavam os pertences das pessoas e colocavam nos tratores sem nenhum preparo.

Foto: Júlia Mesquita / Moradores em situação de rua reviram o lixo.

O artista plástico Raphael Escobar, voluntário no antigo De braços abertos, acredita que o estrago na cidade foi bem maior, pois “antes, o ‘fluxo’ [nome dado pelos usuários à super concentração dos mesmos] estava mais localizado naquela região” e “agora está espalhado por toda cidade”.

“O que é mais irônico é que a atual gestão quer vender o peixe de que acabaram com a cracolândia” – completa Escobar, durante escuta do Território com os alunos da PUC-SP, proposição do Memorial da Resistência realizada no dia 21 de setembro na sede do teatro Pessoal do Faroeste.

Com as duas ações – tanto a de Haddad, como a de Dória – fracassadas pelo ponto de vista das políticas públicas e sociais, o combate às droga exige ações da medicina e da área de saúde pública. Os políticos têm de parar de pensar em suas reeleições e começar a pensar na vida das pessoas – não a curto prazo, mas com o objetivo longínquo.

O caos de todo dia

Texto por Daniel Yazbek, Giovanna Cicerelli e Júlia Mesquita

A Zona Leste da cidade de São Paulo é conhecida pelos paulistanos, entre outras coisas, pela dificuldade de locomoção, pelo trânsito caótico e, principalmente, pela quantidade de pessoas nos transportes públicos – trens, ônibus e metrôs. Quando somadas as seis linhas de metrô e trem que percorrem o território, vêm junto as queixas, sobretudo, da Linha 3-Vermelha, que interliga Barra Funda à Itaquera, a qual lidera o ranking de reclamações segundo a própria Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô). Só nos primeiros seis meses de 2016, os usuários  registraram 2.398 reclamações no mesma via, isto é, pouco mais do que 13 contestações por dia – em média, a cada um milhão de viagens feitas são registradas 1,6 mil queixas. 

As reclamações variam, vão desde o atendimento pelo funcionário ao usuário, passam pela segurança, e chegam onde não podia faltar: o conforto. A Secretaria de Transportes Metropolitanos (STM), faz pouco caso, diz que o aumento das queixas em 2016 é “uma pequena oscilação” e joga a culpa nos vendedores ambulantes que, por conta do agravamento da crise, aumentaram nos últimos tempos.

Foto: Secretaria de Transportes Metropolitanos/Mapa do Metrô e Trêm de São Paulo.

Se o assunto é a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM), a questão fica ainda mais complicada: no período entre 2015 e 2016, a insatisfação do usuário subiu 10,5%, a Linha 12-Safira, que liga a estação Brás à Paranapiacaba, é quem encabeça o quadro de aborrecimentos. A CPTM, assim como Metrô, manifesta seu descaso com o trabalhador quando declara que o descontentamento se dá por conta das obras na via.

Ao tratar do transporte coletivo por intermédio de ônibus, é que se encontra o olho do furacão, isso porque o sistema ponteia o número de queixas na cidade. Com base na pesquisa realizada pela Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP), em 2014, apenas 35% dos usuários classificaram o modelo como bom ou excelente – sabe-se que dez anos antes, em 2004, o índice de aprovação era de quase o dobro: 61%.

As principais reclamações dos usuários são: a lotação dos veículos – que têm gente quase saindo pelas janelas; o tempo de espera nos pontos de ônibus – principal reclamação registrada por passageiros na SPTrans nos primeiros seis meses da gestão de João Dória (4.563 – 27 por dia), que em certos locais, especialmente da Zona Leste, ultrapassam 40 minutos; desrespeito aos assentos preferenciais – o que ocorre igualmente nos trilhos da CPTM e do Metrô; e a falta de educação das pessoas – particularidade quase que intrínseca ao brasileiro. A campeã em reclamações é a linha de ônibus 5630/10 que articula o Terminal Grajaú ao Metrô Brás.

O Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo (SPUrbanuss) atribui a culpa das reclamações aos seus colaboradores e disse em nota que “a empresa promove ações de reciclagem” com os mesmos quando são registradas queixas. Segundo a SPTrans, a fiscalização e vistorias têm se intensificado da mesma forma que o investimento na requalificação de motoristas. Como habitual, a culpa é do empregado, do mecanismo, até mesmo do cliente, mas nunca do patrão.

Contudo, o número de reclamações sobre os ônibus da capital paulista diminuem ano a ano. Em cinco anos – de 2013 a 2017 – reduziu em 70% e destes muito se deve ao ex-prefeito Fernando Haddad que, durante sua administração, superou a meta e entregou 416 quilômetros de faixas de ônibus à cidade, 177% a mais do que o previsto em seu plano de governo.

Ilusões à parte, a população continua insatisfeita. São Paulo, onde se têm uma frota de 8,3 milhões e em média 1,4 ocupantes por carro, segundo balanço realizado pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), tem o problema de engarrafamentos com origem mais simples do que se parece: a maioria dos motoristas não leva sequer um passageiro no veículo, o que faz a lentidão ser ainda mais caótica.

Isso significa que, apesar de todos esforços feitos com o transporte público, o trabalho continua a ser pouco para dimensão do transtorno, sufoco e complicação que as ruas da cidade vivem, pois não se vai a fundo no problema: as pessoas sabem que o transporte público pode acabar com o trânsito lento e carregado, porém não têm confiança na utilização do mesmo.

A Zona Leste é apenas um recorte da cidade que, há muito tempo, vive uma crise no sistema de mobilidade urbana. Estudar, interpretar e compreender os dados fornecidos pelas companhias, empresas, concessionárias e associações não é uma tarefa fácil. A bagunça da metrópole de São Paulo ultrapassa os limites dos setores previamente divididos. Falar de transporte não é possível sem que se fale de política, sociedade, economia e todos outros âmbitos que compõem a vida. O que resta é debater e em especial instruir-se, bastante e sempre, para que assim se atinja uma comunidade cada vez mais justa e igualitária, talvez desta forma os problemas do meio urbano possam ser resolvidos pouco a pouco, através do diálogo, coisa que está em falta no mercado.  

Natureza na cidade

Por Ana Beatriz Pattoli,  Ana Luísa Menechino, Laura Doubek e Paula Zarif

Em uma viela próxima à movimentada Rua da Mooca, na zona leste, uma surpresa: garrafas pet cortadas decoram as paredes. Dentro de cada uma, flores e temperos estão à disposição dos moradores da região. Apesar de ser novidade na Mooca, os jardins e hortas verticais já são um fenômeno e estão presentes em grandes cidades do mundo, como Barcelona e Paris. É comum que eles apareçam em muros cinzas e como uma forma de compensar o pouco verde encontrado na cidade – o que pode ser um problema, como iremos discutir mais abaixo. No caso da rua Iolanda, a pequena viela, a horta trouxe verde e vida. A verdade por trás dos moradores que hoje estão engajados em manter o espaço é uma montanha de lixo, que crescia diariamente e só foi retirada há cerca de um mês.

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No lugar do lixo, a natureza faz presença

“Eu não passava lá; ninguém passava porque dava medo, agora todo mundo passa para ver e até para cortar caminho”, conta Gabriele Macedo, de 33 anos. Com a horta, mais mudanças: uma placa alerta os moradores que haverá uma multa caso seja depositado lixo ou entulho e indica o ecoponto mais próximo. Maria do Rosário, de 60 anos, já viu que a horta vertical chamou mais atenção para sua loja. “Antes o aspecto de sujeira, mas, agora, é muito mais convidativo”, comenta. Hoje, os jardins verticais também estão presentes no Minhocão e na avenida 23 de Maio.

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Os vasinhos nas paredes podem ser até uma forma de chamar atenção para o estabelecimento

A instalação de jardins verticais nas fachadas de prédios, nas colunas de viadutos e em paredões pelas cidades ajuda a melhorar a qualidade de vida e a deixar as metrópoles menos cinza. Só que, quando se fala na construção de paredes verdes como forma de compensar danos ambientais, nem todo mundo é tão favorável assim à medida. A compensação ambiental, como o próprio nome diz, é uma prática que tem como objetivo equilibrar o impacto na natureza causado pela construção de edifícios e outras intervenções nas cidades.

A forma mais tradicional de se fazer isso é com o plantio de árvores, e o ambientalista Ricardo Cardim defende que continue sendo assim. “Os jardins verticais não são páreo para as árvores em melhoria ambiental, durabilidade ou custo. As árvores cortadas por conta de alguma obra só podem ser substituídas por novas árvores. Qualquer solução diferente dessa é tecnicamente errada”, diz ele.

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Além de auxiliarem no meio ambiente, os jardins verticais colorem a cidade

O engenheiro agrônomo e presidente da ONG Iniciativa Verde, Roberto Resende, faz coro: “A tecnologia do jardim vertical é boa e útil, mas jamais terá o mesmo valor ambiental que o plantio de árvores. Para que as paredes verdes servissem como compensação ambiental, seria necessário multiplicar sua extensão em várias vezes”, explica. Os dois profissionais, no entanto, fazem questão de salientar que não estão defendendo a abolição dos jardins verticais nas cidades, apenas o seu uso como forma de compensar danos ao meio ambiente.

“Existem lugares em que as calçadas estreitas impedem qualquer tipo de arborização e, nesses casos, as paredes verdes podem, sim, melhorar a qualidade de vida”, explica Resende. “A técnica traz, sim, benefícios ao ambiente, mas deve ser custeada inteiramente – da plantação à manutenção, que é complexa – por iniciativas privadas, sem recorrer ao dinheiro público, e sem que isso seja considerado compensação ambiental”, reforça Cardim. A posição da dupla, portanto, é clara: plantar árvores para repor o que é tirado da Natureza e, como complemento, criar jardins verticais. Afinal, quanto mais verde nas cidades, melhor para quem vive nelas.

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Especificadas através dos nomes na parede, as plantas são convidativas

Sesc Belenzinho: centro cultural na Zona Leste

Texto por Gabriela Fogaça e Sofia Missiato

O Sesc – Serviço Social do Comércio – é um projeto cultural e educativo que iniciou em 1946. Com o intuito de promover a transformação social, o Sesc traz diversos eventos e trabalha em campos relacionados à cultura, saúde, cursos, serviços sociais, entre outros, para todos os públicos. São 35 unidades espalhadas pela Capital e Grande São Paulo, além de contar com um projeto de expansão que planeja inaugurar novas unidades na Avenida Paulista e em Guarulhos.

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Foto: reprodução da internet.

Adentrando o Sesc Belenzinho

Museus, objeto arquitetônico, relações com seu sítio, abrangências cultural e simbólica, ora apresentando-se como pólo transformador de espaço, pessoas e vidas, ora como peças de marketing para instituições comerciais. Hoje perguntamos e discutimos a relevância das artes nos museus como inclusão social; neste sentido, a inclusão social pode ser entendida como a ação cultural e educacional que é proporcionada às populações que se mantém à margem dos benefícios do desenvolvimento social e econômico. É a ideia inicial no Sesc, a iniciativa não-formal de promover conhecimento por meio de diversos cursos que cada unidade proporciona. O Sesc Belenzinho foi reconhecido por melhorar o entorno na região, dando a possibilidade dos moradores a terem acesso às atividades por um preço justo, além da carteirinha da unidade que possibilita mais benefícios, como o acesso às quadras de jogos, o barateamento de oficinas, entre outros.

Dando ênfase na programação de outubro-novembro, conhecemos o Sesc Belenzinho e assistimos uma peça que está em cartaz até 26 de novembro, “A Invenção do Nordeste”. O espetáculo trata de um diretor contratado para selecionar um ator nordestino que possa interpretar uma personagem “nordestina” e que, depois de vários testes e entrevistas, são selecionados dois atores para a fase final. O diretor tem sete semanas para deixá-los prontos para um último teste. Durante esse período, eles refletem sobre sua identidade, cultura, história pessoal e descobrem que ser e viver uma personagem nordestina não é tarefa simples.

Com toda certeza, não é uma peça focada no marketing para instituições comerciais, pois tais assuntos são silenciados ou pouco interessantes para a indústria cultural de massa. Assim, o Sesc Belenzinho pode ser considerado inovador em suas temáticas teatrais, abrangendo moradores da Zona Leste e gerando um sentimento de identidade, seguindo o propósito da inclusão social.

Inaugurado em 2010, o Sesc Belenzinho possui subsolo, térreo inferior e superior. O local funciona de terça a sábado das 9h às 22h, e domingos e feriados das 9h às 20h.

 

S.O.S: PARQUE TIQUATIRA

 

Texto escrito por Julia Castello Goulart e Carolina Gomes

Podcast por Letícia Nascimento e Carolina Gomes

Fotos por Nádya Duarte

Imagens das áreas do parque com acúmulo de lixo

O Parque Linear Eng⁰ Werner Eugênio Zulauf, conhecido apenas como Parque Tiquatira, se localiza no bairro da Penha, na Zona Leste da cidade de São Paulo. O parque separa as duas vias da avenida Governador Carvalho Pinto e sua extensão vai do final do viaduto General Milton Tavares de Souza até a avenida São Miguel.

Com mais de 3 Km de extensão, calcula-se que este parque abrigue 20 espécies de aves e sua vegetação é composta por áreas ajardinadas, gramados, bosques heterogêneos e arborização esparsa.

Além de ser conhecido por ser uma área de preservação de espécies vegetais e animais, o parque conta com vários espaços de lazer, como pista de skate, quadras, campo de futebol, pista de Cooper e caminhada, Ciclofaixa, anfiteatro aberto e áreas de convivência como quiosques com mesas e bancos.  Em vários períodos do dia é comum ver a própria população local utilizando o parque, principalmente aposentados e animais de estimação com seus donos.

O parque foi inaugurado em 2007 e é o primeiro parque linear da capital paulista, pois foi feito seguindo as margens do córrego Tiquatira. A intenção é exatamente garantir a preservação do córrego, por meio de ajardinamento e arborização de faixa mínima ao longo das margens.

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Córrego do parque Tiquatira

 A área é considerada pelo Código Florestal como “área de preservação permanente” que deve ser coibido o despejo de esgoto e lixo no parque e no próprio córrego através de educação ambiental e uso adequado do espaço público. Mas a realidade do parque hoje está muito diferente do que a prevista.

Entre as variedades de plantas e espécies animais, o lixo se tornou normal na paisagem do parque.Acompanhados de uma discutível vista que mescla árvores frutíferas, aparelhos para exercitar os músculos, garrafas, sacos de lixo, caixas de remédio, restos de comida e preservativos usados, os moradores da região utilizam do que resta de área limpa e conservada do parque Tiquatira para se exercitar ou apenas fazer uma simples caminhada com o seu cão, como é o exemplo de Ricardo Luíz Miguel.

Ele passeia com seu pitbull todas as manhãs e declara que o estado atual do parque a respeito da manutenção “é muito ruim, é muito sujo”. Aponta que a prefeitura carece de atenção com o espaço e quando há uma coleta de lixo feita pela mesma, a sujeira é deslocada para as ruas de cima aos gramados que, no decorrer do tempo, desce com o barranco por causa do mal tempo. Ou seja, o problema não é solucionado, mas sim, transferido de lugar, temporariamente.

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Ricardo Luíz Miguel passeando com seu cachorro.

 A aposentada e ex-funcionária pública, Maria de Lurdes de Almeida da Silva Pereira, frequentadora esporádica do parque, indica outro aspecto inadequado da área: a falta de acesso a cestos de lixos ou caçambas. A ausência desses itens leva as pessoas a descartar o lixo no chão ou até colocar seus descartes em sacolas plásticas amarradas nos troncos das árvores. Conclui que se houvesse uma atenção maior da prefeitura, iria ter uma preservação e valorização melhor ao parque. “Quando o poder público está frequentemente observando as necessidades, ele iria observar a quantidade de lixo no parque e ver as necessidades do local.”

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Grafite na área de convivência do parque.

Fernando Teixeira de Araújo que corre algumas manhãs pelo parque acredita em um conjunto de vilões para a poluição da área: as pessoas que frequentam o parque a noite, o lixo que o córrego traz quando enche por causa das chuvas, dos moradores que põe os sacos de lixo para fora de casa no dia errado da coleta, os motoristas e os habitantes da região. “O povo é meio sem educação”. O parque Tiquatira grita por atenção e espera que junto ao poder público, a comunidade ajude a preservar suas extensões.

Saiba mais sobre os problemas do Parque Tiquatira:

O estádio das contradições

Por Elaine Bertoni

A presença da sede oficial do clube de futebol Corinthians no bairro do Tatuapé e a Arena Corinthians em Itaquera, ambos bairros da Zona Leste, é um dos principais motivos da forte identificação de grande parte dos moradores da região com a instituição e fazem com que haja uma grande ligação, dentro do imaginário popular, entre os moradores da Zona Leste e os torcedores da equipe paulista.

Por várias décadas, dirigentes do Corinthians prometeram construir um novo estádio para o clube, já que o Estádio do Parque São Jorge tem capacidade inferior a 18 mil espectadores. Entre as décadas de 1950 e 1960, o presidente Vicente Matheus sonhava em construir um estádio para mais de 200 mil torcedores, segundo o jornal Folha de S.Paulo. Como o plano exigia uma grande área, Matheus solicitou à prefeitura um terreno localizado em Itaquera e uma projeção de construir o estádio entre três a cinco anos. Em novembro de 1978, o pedido foi atendido pelo prefeito Olavo Setúbal, que aprovou a concessão de uma área de 197 mil metros quadrados, de acordo com o jornal O Estado de S.Paulo. Sem obter financiamento, o projeto de Matheus acabou sendo arquivado.

Em agosto de 2010, o presidente Sanches revelou em entrevista ao jornal O Estado de S.Paulo, um novo projeto para um estádio corintiano. Aníbal Coutinho, arquiteto responsável pela obra, projetou o estádio para ser “um estádio que iria ajudar os torcedores, que poderia auxiliar a equipe a vencer as partidas, eu queria fazer os torcedores chegarem em campo”. Ele liderou uma equipe de 25 arquitetos, com número máximo de trabalhadores no local de 2300 pessoas. O campo fica a exatamente a 777 metros acima do mar, como explicado por ele “o número 77 é considerado de sorte para o time. O clube está localizado no número 777 da Rua São Jorge, o que traz à mente 1977, quando eles ganharam um de seus campeonatos mais famosos de todos os tempos (o Campeonato Paulista de Futebol de 1977)”.

A estimativa de que a abertura da Copa do Mundo FIFA de 2014 traria quase 31 bilhões de reais em 10 anos para o município de São Paulo estimulou a cidade a sediar o jogo de abertura. Para sediar a partida de abertura foi necessário realizar modificações no projeto original, o que elevou o custo original de 335 milhões de reais para 1,2 bilhão de reais para atender aos requisitos da FIFA. Além disso, devido a acordos da FIFA com o Brasil, todas as construções relacionadas com a Copa do Mundo não podem ser tributadas pelo governo federal brasileiro. Por contrato, o Corinthians é obrigado a destinar toda a receita do estádio, incluindo bilheteria, propriedades comerciais (como camarotes e lojas) e naming rights, inicialmente para pagar a dívida contraída com o BNDES.

Inicialmente, a Odebrecht previa entregar a Arena Corinthians em dezembro de 2013. Contudo, o cronograma de entrega sofreu atrasos por conta de acidentes na obra e a construtora entregou oficialmente o estádio em abril de 2014. No dia 1 de maio ocorreu uma partida entre operários que trabalharam na construção da arena, com entradas limitadas e distribuídas pela Odebrecht somente a funcionários e aos seus familiares. A partida inaugural ocorreu no dia 10 de maio, com a realização de uma partida entre “Corinthians x Corinthians”, que reuniu antigos atletas do clube, como Basílio, Wladimir, Vampeta, Marcelinho Carioca, entre outros.

Uma série de problemas foram enfrentados pelo Estádio do Corinthians, como buracos em pisos, um grande vazamento de água e até mesmo possíveis abalos em arquibancadas. O cenário descrito era de risco de acidentes e suspeita de falhas de montagem e uso de materiais de baixa qualidade durante a obra. Uma auditoria externa contratada pelo Corinthians apontou diversos problemas na construção e omissão de acabamentos e trechos de obras do estádio. Como resultado ocorreram infiltrações em partes de paredes e tetos e um pedaço do teto do saguão principal da Arena Corinthians desabou.

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Redução de danos no combate às drogas na Cracolândia é alternativa à tratamento convencional

Texto por Débora Bandeira e Thalita Archangelo; Vídeo por Beatriz Gimenez e Rachel Castilho

Em maio deste ano, a Prefeitura de São Paulo e o Governo do Estado realizaram uma megaoperação na região da Cracolândia para combater o tráfico de drogas no local. Segundo a Secretaria de Segurança Pública a ação prendeu 53 pessoas. Além disso, um usuário ficou ferido. Depois desse episódio, o debate acerca dos métodos utilizados no combate às drogas e sua verdadeira eficácia ganhou força.

A redução de danos, por exemplo, é um dos principais métodos alternativos ao tradicional tratamento de internação. Fernando Haddad (PT), prefeito de São Paulo até 2016, havia implementado um programa que contemplava a RD, mas acabou sendo substituído pelo programa do atual prefeito, João Doria (PSDB).

O Ministério da Justiça e Segurança Pública define Redução de Danos como “A promoção de estratégias e ações voltadas para a saúde pública e direitos humanos, devendo ser realizada de forma articulada inter e intra-setorial, visando a redução dos riscos, as consequências adversas e dos danos associados ao uso de álcool e outras drogas para a pessoa, a família e a sociedade”.

Apesar da orientação partir do Ministério da Justiça e não do Ministério da Saúde, a última ação da prefeitura não procurou atender às diretrizes da política de Redução de Danos governamental. Adepto da RD, Rafael Escobar, do Coletivo A Craco Resiste, defende que ela é essencial para a saúde pública. Para ele, alguns usuários vão continuar usando drogas – porque querem ou porque não conseguem parar – portanto, é preciso pensar em maneiras que minimizem o impacto disso tanto para o dependente como para a sociedade.

Assim, o fornecimento de seringas e cachimbos (o que evita o compartilhamento entre os usuários e a proliferação de doenças) e a oferta de empregos para que o usuário tenha fonte de renda, fazem parte dos ideais do coletivo.

Em 2000, o Sistema Único de Saúde (SUS) incorporou a Redução de Danos ao falar da abstinência como apenas uma das opções para dependência química, incentivando a criação de tratamentos alternativos e singulares para cada usuário.

Além disso, o Centro de Atenção Psicossocial-Álcool e Drogas (CAPS AD) se tornou mais uma forma de apoio para tratamento da dependência química. Apesar de sua importância, a unidade que prestava atendimento na Cracolândia foi fechada há pelo menos uma semana. O Governo do Estado, segundo reportagem do Seu Jornal, da TVT, justificou o seu fechamento devido à queda no número de atendimentos.

Tentativas passadas

Em 2012, sob a gestão de Gilberto Kassab (atualmente no PSD), a administração municipal junto com a estadual executou o plano “Centro Legal”. A ação ficou conhecida como “estratégia de dor e sofrimento” porque, na época, o coordenador de Políticas sobre Drogas da Secretaria de Estado da Justiça e da Defesa da Cidadania, Luiz Alberto Chaves de Oliveira afirmou em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, que “a falta da droga e a dificuldade de fixação vão fazer com que as pessoas busquem o tratamento. Como é que você consegue levar o usuário a se tratar? Não é pela razão, é pelo sofrimento. Quem busca ajuda não suporta mais aquela situação. Dor e o sofrimento fazem a pessoa pedir ajuda”.

Já na gestão Haddad (PT), em 2014, a prefeitura realizou o programa “De braços abertos” que tinha como objetivo a reinserção do dependente químico na sociedade através do oferecimento de empregos, profissionalização, apoio a tratamentos, refeições e moradia, assim, estimulando a diminuição do consumo de drogas. Segundo uma pesquisa realizada pela Plataforma Brasileira de Política de Droga, a iniciativa teve resultados positivos: 2 em cada 3 usuários de crack reduziram o uso das drogas após participar do programa.

Hoje, na atual gestão, o programa “Redenção” tem o tratamento como primeiro plano e causa divergência na comunidade psíquica, chegando a defender até a internação compulsória. Para a assistente social Carmén Lopes, que trabalha na região, isso é reflexo da falta de inclusão social e de políticas públicas efetivas e continuadas. “Nosso país não está preparado para nenhuma política pública”, afirmou recentemente em uma palestra na região da luz.

“A Cracolândia aqui acabou, não vai voltar mais. Nem a Prefeitura permitirá, nem o governo do Estado. Essa área será liberada de qualquer circunstância como essa. A partir de hoje, isso é passado”, declarou o prefeito da cidade João Doria (PSDB), em maio.

 A Craco Resiste

Em ação desde dezembro de 2016 através da organização pela internet, A Craco Resiste é um coletivo que tem como objetivo evitar a violência policial na região da Cracolândia. O coletivo se define como “antiproibicionista, abolicionista penal e, antes de tudo, antimoralista” e tem como identidade visual dois punhos fechados segurando cachimbos – objetos utilizados no início do século no consumo do crack para que os usuários não queimassem a boca. A imagem representa a resistência em relação às práticas do Estado e à filosofia da redução de danos, que rege a ideologia do grupo.

Por ser antiproibicionista, A Craco Resiste acredita na descriminalização e regulamentação de qualquer tipo de substância, uma vez que, segundo o coletivo, a proibição não ajuda na busca de tratamento e criminaliza os usuários. Estes, por sua vez, ficam à margem da população sem nenhuma política pública que seja, de fato, efetiva.

O coletivo reúne cerca de 20 colaboradores que realizam vigílias na região central da cidade de São Paulo a fim de estar presente no local para denunciar possíveis atos de violência institucional e resistir a eles. Nessas vigílias, a arte e a cultura são o principal pilar contando com rodas de capoeira, oficinas musicais e exibição de filmes.

Craco resiste
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